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'Agora tenho urgência de vida', diz Renata Capucci em entrevista exclusiva sobre o diagnóstico de Parkinson
Em depoimento ao GLOBO, a jornalista conta como tem lidado com a doença desde os primeiros sintomas e do aprendizado de que a vida acontece independentemente de qualquer controle
Já fazia um tempo que eu vinha gestando a ideia de “sair do armário” do Parkinson. Queria abrir esse segredo, porque é muito ruim viver assim. É uma vida dupla. É como se fosse uma pessoa dentro de casa, outra para aqueles que conhecem e sabem sobre a doença e outra na rua por precisar esconder isso do público. Não aguentava mais isso.
Queria ser eu 24 horas por dia. Essa é a grande questão. Mas demorei um bom tempo para cair a ficha de que eu não precisava ter nenhum tipo de constrangimento porque era algo normal. Primeiro porque não escolhi ter essa doença e segundo que é da vida. Infelizmente ou felizmente coisas ruins acontecem.
E foi de uma maneira tão orgânica, havia chegado a hora de me libertar. Já no final do podcast “Isso é Fantástico”, no qual sou a apresentadora, minha produtora disse algo emocionante sobre as pessoas se abrirem e ajudar outras pessoas revelando seus diagnósticos.
Foi como se uma chave girasse na minha cabeça. Eu simplesmente soube que aquela era a hora de falar que fui diagnosticada com Parkinson há quatro anos. Eu mais vomitei aquelas informações do que falei. Mas foi ótimo. Me senti aliviada. Sou muito chorona, meio manteiga derretida, me emocionei, essa sou eu. Era um momento de catarse de botar isso para fora. A repercussão, apesar de um pouco assustadora, foi boa, recebi muito amor.
Meus sintomas começaram muito leves. Um enrijecimento nos dedos do pé e, quando andava, as pessoas me diziam que eu estava mancando, mas depois entendi que na verdade a minha perna esquerda fazia movimentos mais lentos do que a direita e dava a percepção de que eu estava mancando.
Algo interessante na minha doença é isso: os sintomas são apenas no lado esquerdo. Comecei a tratar com fisioterapia e osteopatia, acreditei que poderia ser um encurtamento da perna, ou algo assim, nada muito grave. Em outubro de 2021, surgiu a oportunidade de fazer o PopStar na Globo, programa em que eu cantava ao vivo. Foi um momento maravilhoso, divertido e desafiador na minha vida.
Antes do sexto programa, estava em casa assistindo televisão com meu marido, quando meu braço se levantou rígido involuntariamente. Mostrei ao meu marido e ele depois me confidenciou imaginar que seria algo até pior, mais grave.
Após o sexto programa, ele me levou até um hospital onde tinha emergência neurológica para fazer um exame clínico com um neurologista. O médico pediu para eu fazer uma ressonância magnética da cabeça e das divisões da coluna vertebral — cervical, torácica, lombar, sacral e coccígea — só para descartar qualquer outro tipo de doença.
Quando saí da ressonância a médica disse: “você está com a doença de Parkinson”. Ali o mundo caiu na minha cabeça. A primeira reação foi a negação. Eu falei: “Você está doida, doutora. Eu tenho 45 anos”. E então ela me disse que um dos primeiros erros das pessoas é achar que a doença só atinge os mais velhos.
Ela não escolhe idade e acomete os jovens. Foi muito difícil receber esse diagnóstico. Demorei para absorver o que aquilo significava. Chorava muito no começo, fiquei extremamente abalada. Claro, tive o apoio da minha família e foi essencial para o meu fortalecimento. No início pouquíssimas pessoas ficaram sabendo, apenas as muito próximas e de extrema confiança. Porque você fica muito confusa. Eu pensei que morreria, não veria meus filhos se casando. Ficaria inválida.
Logo que soube do diagnóstico contei para a direção do Fantástico e da Globo. Tudo foi comunicado na base da transparência. Tive acolhimento total. Nunca ninguém passou a mão na minha cabeça por eu ter essa doença ou falou para eu não fazer algo difícil por ter Parkinson.
Posso dizer com todas as letras que a Globo realmente acolhe diversidades, pois, agora, depois de 28 anos de empresa, faço parte do time das diversidades. Sou portadora de doença crônica e não tenho o menor motivo para ter vergonha de ser quem eu sou, pelo contrário, tenho muito orgulho da minha trajetória e de como conduzi a minha carreira. Nunca passei a perna em ninguém para chegar em algum lugar. Sou muito querida dentro do lugar onde eu trabalho e tenho orgulho de verdade de tudo que eu construí.
A desinformação é a pior coisa que acontece em um momento como esse. Eu nunca tinha feito nenhuma matéria sobre Parkinson. Sabia apenas o básico, o que a maioria das pessoas sabe, ou seja, uma doença que acomete os idosos e que as pessoas começam a tremer.
Foi tudo uma grande descoberta. Eu comecei a pesquisar e a estudar e vi que os sintomas começam muito antes dos motores. Entre os sinais primários estão a perda do olfato, e de fato, eu eventualmente sinto cheiros mais fortes. Olhando para trás, eu não lembro a última vez que eu senti um cheiro forte de algo. Eu estou cozinhando uma berinjela, por exemplo, se eu não coloco o timer, ela queima.
A doença de Parkinson é algo cíclico. Um dia você acorda muito bem e no outro muito mal, nunca saberá como vai estar no dia seguinte. As pessoas me perguntam o que eu estou fazendo? Que remédio estou tomando? Mas a verdade é que existe um protocolo de tratamento diferente para cada pessoa, porque o Parkinson é diferente para cada paciente. O tipo e os sintomas que eu apresento, são diferentes daqueles que o outro terá. A intensidade e a força também mudam. Uma pessoa tem a tremedeira, o outro tem a marcha lenta, o outro tem tudo isso, uns tem episódios de congelamento. Varia de acordo com o paciente e o tratamento também é modificado para as necessidades do paciente. É algo muito pessoal e eu o levo muito a sério.
Eu digo que há momentos em que o medicamento está on e off. Quando ele está na posição on eu sou uma pessoa absolutamente normal, mas quando ele está em off, os sintomas aparecem e sei que está na hora de tomar o medicamento novamente. Eu também faço uso de canabidiol, foi prescrito pela minha médica, pois ajuda na insônia que é uma das características da doença de Parkinson.
Eu durmo como um passarinho. Realmente me relaxa bastante. Me ajuda a dormir. Eu sempre dormi igual uma pedra, mas ele me ajuda ainda mais a dormir. Eu sempre fui a favor de tudo que pode ajudar, e sabemos que o canabidiol é usado em diversos tipos de doença. Desde tratamento de câncer, de esclerose múltipla, autismo, convulsões, epilepsia. As pessoas não têm informação sobre o que é, e acha que é apenas maconha.
Eu estou muito feliz, pois tenho recebido inúmeras mensagens de pessoas que ouviram o podcast e acreditam ter a doença com base nos sintomas que eu relatei e vão procurar ajuda médica para ter o diagnóstico e isso para mim é o que mais importa. No que eu puder fazer para ajudar a desmistificar, a tirar o estigma dessa doença que não é o fim da linha, eu vou fazer. Se eu olho para trás, eu vejo que estou fazendo exatamente tudo o que eu fazia há quatro anos. Se eu quiser participar do PopStar de novo, eu posso, posso cantar, dançar, fazer exercícios físicos. Eu corro na areia da praia. Faço matéria, viajo, vou para a Amazônia, Florianópolis. Sou mãe, tenho marido, cachorra. Eu faço e posso fazer tudo normalmente. Nada mudou na minha vida.
Minto, uma coisa mudou: a urgência de vida. A certeza de que as coisas acontecem independentemente de você querer ou achar que pode controlar. Você não sabe como vai estar daqui um mês, seis meses, um ano. E essa é a maior verdade, a gente não controla absolutamente nada na vida da gente.
Eu encaro isso de frente, com resiliência e muita força. Tenho certeza de que essa é a única maneira de ter uma qualidade de vida melhor. A uma alternativa é sentar e chorar e, com certeza, essa não é uma opção para mim. Já perdi três filhos, tenho duas filhas lindas, tenho um emprego que eu amo, adoro ser repórter, adoro trabalhar no Fantástico. Só tenho que agradecer a minha vida.
Amo minha família, meu marido, minhas filhas, tenho pai e mãe vivos. Tenho muita coisa boa para celebrar. Não estou aqui para ficar olhando para trás e reclamar. Já fiz isso, já chorei o suficiente.
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