Por todos os séculos
Existem momentos que dispensam palavras. Falam por si mesmos, desde o princípio, agora e sempre, por todos os séculos dos séculos. Para a escritora Fernanda Young, por exemplo, “Coração quebrado tem cura: A paz de não precisar mais aguardar a perfeição que não existe”.
Anteontem, uma celebração entrou para a posteridade após repercutir nas redes sociais. Gabriel Medina enfrentou Kanoa Igarashi, que o derrotara nas Olimpíadas de Tóquio, mas em Paris ele queria reescrever a história.
No terceiro dia de competição em Teahupo'o, uma vila na costa sudoeste da ilha do Taiti, Polinésia Francesa, Medina começou com uma onda pequena, preparando o tom para o que estava por vir. Menos de dois minutos depois, ele pegou a maior onda do dia, obtendo 9,9 dos juízes, a maior nota da história do surfe nas Olimpíadas. Dois dos cinco jurados chegaram a dar 10.
O êxtase de Medina produziu outro momento singular: ele saltou da prancha, ergueu o dedo indicador sinalizando o número 1 e o equipamento voou em paralelo, enquanto o fotógrafo Jérôme Brouillet registrava o fato. “As condições eram perfeitas, as ondas mais altas do que esperávamos”, disse Brouillet ao The Guardian. “Eu não podia vê-lo até que ele apareceu, tirei quatro fotos e uma delas era esta. Não foi difícil tirar a foto, foi mais sobre antecipar o momento e saber onde ele começaria a onda.”
A imagem é extraordinariamente linda e natural. Um tapa na cara dessa coisa chamada Inteligência Artificial que intriga e assusta a quase todos ao retocar tudo ultimamente.
Eliminado por Medina nas oitavas de final do surfe na Olimpíada de Paris 2024, Igarashi comentou uma publicação feita pelo brasileiro nas redes sociais. Na segunda-feira (29), após a vitória por 17,40 a 7,04, o vencedor postou a foto que viralizou da sua comemoração após uma onda praticamente perfeita, com a legenda: “Tudo posso naquele que me fortalece”. Entre os inúmeros comentários, um chamou a atenção. Em português, o japonês “reclamou” que Medina não deixou passar nenhuma onda. “Pô! Nem deixou uma para a gente (é rir para não chorar)”, escreveu.
Embora o surfista brasileiro tenha dado mais um passo em direção ao seu objetivo da medalha olímpica, ele certamente sentiu que os juízes poderiam ter sido mais atenciosos com seu esforço. “Senti que era um 10”, disse o tricampeão mundial da WSL. “Já fiz uns 10s antes e pensei: é definitivamente um 10”.
Ainda que o desempenho nas águas possa não ter merecido nota 10, a foto de Jérôme Brouillet foi certamente a imagem da perfeição. A imagem de Medina levitando sobre o mar me remete à figura de Hermes, o deus mais controverso e polêmico da mitologia grega, filho de Zeus com uma ninfa chamada Maia. Era conhecido como o mensageiro dos deuses do Monte Olimpo, que levava mensagens para diferentes locais usando sandálias aladas que facilitavam o seu deslocamento, além de responsável por fazer com que as pessoas sonhassem enquanto dormiam.
Hermes era tido ainda como inteligente, furtivo e capaz de eventualmente pregar algumas peças como o deus do comércio, da diplomacia, da fertilidade, dos ladrões, dos rebanhos, da riqueza, da sorte, das viagens e o responsável por encaminhar as almas dos mortos até as margens do rio que levava ao submundo, dentre outros atributos. Quer algo mais brasileiro do que isso?
Medina avançou às quartas de final da competição, oficialmente marcada para ontem, terça-feira (30), tendo como adversário o também brasileiro João Chianca, o Chumbinho. Mas os dois terão que esperar um pouco para se enfrentarem nas ondas gigantes a mais de 15.700 quilômetros de Paris. O Comitê Olímpico Internacional (COI) decidiu adiar as quartas de final do surfe e a disputa por medalhas. As provas estavam inicialmente programadas para as 14h (horário de Brasília), 7h no horário local.
Retorno à icônica imagem do fotógrafo francês, porque ela também me fez recordar de um texto do jornalista Fernando Calazans, publicado há mais de 20 anos numa revista comemorativa dos 50 anos de Zico, o último jogador completo do futebol brasileiro (atenção, flamenguistas: reconhecimento de vascaíno tem peso dobrado, hein?!). Calazans arrematou seu texto lembrando que Zico não esteve em nenhuma das cinco Copas que o Brasil conquistou. “Mas não há o que lamentar. Hoje, do alto dos 50 anos dele, eu posso dizer daqui: se Zico não foi campeão do mundo, azar da Copa do Mundo que perdeu um grande campeão. O que importa é que o futebol ganhou Zico.”
Hoje, 31 de julho de 2024, quando publico este texto, ouso dizer a vocês que, se uma medalha olímpica não repousar sobre o peito de Gabriel Medina daqui a poucas horas (os deuses olímpicos, entre eles Zeus, Apolo, Afrodite, Dionisio e Hermes, sabem disso!), azar dos Jogos Olímpicos. O que importa é que a vida se fez mais leve e linda depois que aquela imagem inspiradora passou a circular pelo mundo, agora e sempre, por todos os séculos dos séculos. Amém!
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